Luís Palma



Belfast: Verde #1 (tradução)

Belfast: Verde #1 (tradução)

Belfast: Verde # 1.

[…]

Eles construíram grandes muros como este, escondiam-se neles. (1)
Acabaram com todos os campos de futebol. Era o que tínhamos.
Então, decidimos lutar contra os britânicos nas ruas.

Todas as guerras são uma luta contra a ocupação.
As forças de ocupação põem-te sempre um rótulo.
Rotulam-te: «És um terrorista». Somos terroristas no nosso próprio país.

Não passávamos de estudantes – rapazes, raparigas.
Andávamos na escola quando esta guerra começou.
Eu nunca me meti em sarilhos em toda a minha vida!

E de repente, por termos decidido lutar por aquilo em que acreditávamos, éramos terroristas.
Não estávamos a lutar pela liberdade.
Éramos terroristas na nossa própria cultura. Era esta a situação, certo?

Portanto, decidimos lutar – rapazes, raparigas – e enfrentámos os britânicos nas ruas.

Éramos soldados, embora não passássemos de miúdos, jovens.
Fomos muito eficazes na luta contra o exército britânico.
Morriam soldados todos os dias.
Morriam polícias todos os dias.
Fazíamos guerra aos soldados britânicos, era isto que estava a acontecer.

E todas as guerras são uma luta contra a ocupação.
Eles tinham serviços secretos para fazer o trabalho sujo – o “MI5”, o “MI6”.
Apareciam aí à paisana, vestidos como tu, mas na realidade eram soldados.
Entravam nas zonas dos católicos, disparavam contra as pessoas e culpavam os protestantes.
Entravam nas zonas dos protestantes, alvejavam gente inocente e culpavam os católicos.

A coisa estava a tornar-se sectária. Compreendes?
E era tudo obra dos ingleses. Compreendes?

Foi aqui que começou o ódio.
Por isso decidimos lutar e fomos muito eficazes nessa luta.
Em todas as guerras o apoio da população é fundamental. O nosso lado apoiava-nos a cem por cento.
Mas aqui o apoio mais importante foi o das mulheres.

Sem elas não teríamos podido lutar.
Quando se fala de guerra, fala-se sempre dos homens que morrem em combate.
Ninguém se lembra das mulheres. Mas muitas das nossas raparigas morreram.
Muitas das nossas raparigas sofreram nas prisões.

Vou-te contar mais algumas histórias que aqui ocorreram, à medida que formos andando.

Está bem assim?

- Sim, parece-me bem

[…]


(1)

O muro de Belfast serviu para dividir territórios entre Republicanos e Unionistas.
Ao contrário do muro de Berlim, que foi construído em betão armado pelo regime da União Soviética, uma grande parte
deste é de aço.
Desde a revolução industrial que a indústria naval representa um sector muito forte na economia desta região.
No início do século XX, nestes estaleiros foi construído o Titanic a partir de um trabalho que contou com a colaboração da
Universidade de Ulster.
A associação entre este metal, a cidade e a indústria naval, na relação até com a fronteira marítima que separa o Oceano Atlântico
do Mar do Norte, não é de todo irrelevante.

© LUÍS PALMA